Pessoas com Deficiência e o mercado de trabalho

#Marinalva Cruz

Prestes a completar 30 anos e conhecida como “Lei de Cotas”, a Lei 8.213 criada em 24 de julho de 1991, determina em seu Art. 93 que empresas com 100 ou mais funcionários reservem de 2% a 5% dos seus cargos para contratação de pessoas com deficiência ou beneficiários reabilitados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e tem como principal objetivo garantir equidade e igualdade de oportunidades.

De acordo com o Portal da Inspeção do Trabalho (https://sit.trabalho.gov.br/radar/), a lei de cotas garante menos de 800 mil vagas de emprego formal para brasileiras e brasileiros com algum tipo de deficiência ou reabilitados do INSS.

Considerando os dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), em 2018 apenas 50,62% das vagas reservadas pela Lei de Cotas estavam ocupadas, gerando assim uma série de argumentos e frustrações entre empregadores e trabalhadores. Por um lado, há empresas que dizem não encontrar profissionais com deficiência qualificados e em quantidade suficiente para cumprir a legislação e, por outro, pessoas com deficiência argumentando que não há vagas para profissionais capacitados, que o mercado de trabalho só disponibiliza vagas que não exigem formação.

Os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, censo demográfico de 2010, revela que no Brasil há quase 9 milhões de pessoas com deficiência, em gradações mais severas (não consegue de modo algum ou com grande dificuldade) e com idade entre 18 e 64 anos. Isso significa que há muito mais pessoas com deficiência em idade economicamente ativa do que vagas reservadas pela Lei de Cotas.

Além dos dados acima, pesquisas têm mostrado que as dificuldades encontradas no processo de cumprimento da legislação, não estão relacionadas à falta de pessoas ou ao grau de escolaridade, o não cumprimento da lei se deve a outros fatores, especialmente culturais e atitudinais.

É certo que ainda não existe a condição de pleno emprego para todos os brasileiros e brasileiras com deficiência e que são muitos os desafios (barreiras tecnológicas, arquitetônicas, urbanísticas, no transporte, na comunicação e nas atitudes), mas, é possível avançar e para isso, as empresas, públicas e privadas, precisam mudar o olhar, entender que todas as vagas devem ser para todas as pessoas, que eliminar barreiras não significa custo, ao contrário, é um investimento e que a pessoa com deficiência também é ou pode ser um cliente em potencial, portanto é fundamental considerar a interseccionalidade da pessoa com deficiência nos demais temas relacionados a diversidade e inclusão, atuar de forma transversal e se comunicar de maneira acessível e inclusiva, considerando a diversidade humana com um todo.

Vale ressaltar que inclusão é um via de mão dupla, portanto, as pessoas com deficiência também tem um papel importante nesse processo, é preciso conhecer os direitos e entender que há deveres, saber que a Lei de Cotas garante a vaga, mas a manutenção do emprego depende de cada pessoa, em resumo, cada um precisa fazer a sua parte e contribuir para que haja equidade e igualdade de oportunidades para todas as pessoas, independente de raça, gênero, deficiência, religião, orientação sexual ou qualquer outra característica.

Apesar das inúmeras oportunidades, nem todas as pessoas com deficiência poderão acessar o atual modelo de trabalho, sendo assim, vale considerar as especificidades de cada grupo, estabelecer novos modelos de trabalho e utilizar-se de metodologias como o emprego apoiado e tecnologia assistiva, para garantir o direito ao trabalho a um número maior de pessoas com diferentes habilidades.

Já regulamentado no Brasil e presente na vida de muitas pessoas, especialmente durante a pandemia do novo Coronavírus, o Home Office também tem se mostrado uma ótima alternativa para ampliar as possibilidades de inclusão no mundo do trabalho, mas carece de muita cautela, pois, essa modalidade de trabalho não deve ser disponibilizada de forma obrigatória para pessoas com deficiência, deve-se respeitar a escolha e o perfil de toda e qualquer pessoa, tendo em mente o real objetivo da legislação brasileira.

É nítido que a lei de cotas tem sido uma importante aliada para inclusão econômica das pessoas com deficiência, mas para ser mais efetiva, as empresas, públicas e privadas, precisam mudar o olhar, atuar em rede, considerar a participação de diferentes atores, tornar os sites, aplicativos, processos internos e externos cada vez mais acessíveis e inclusivos, focar nas habilidades e competências de cada pessoa, disponibilizar conteúdos em diferentes formatos e estar sempre disponível para mudar conceitos e criar novas estratégias para fortalecimento e valorização da diversidade humana.

Formada em Gestão de Recursos Humanos pela UniSant’Anna e pós graduada em Gestão Pública pela FESPSP. Tenho mais de 17 anos de experiência no setor público, desenvolvendo projetos em empresas públicas e privadas, com foco na diversidade, acessibilidade e inclusão, social e profissional de grupos minorizados, em especial, pessoas com deficiência.

#PraTodosVerem: Foto em fundo branco e Marinalva em close. Ela sorri, tem pele branca, cabelos lisos com mechas prateadas, altura dos ombros. Veste blusa preta e blazer branco com listas pretas, mangas na metade dos braços, usa colar rente ao pescoço. Está com o braço direito em frente ao corpo e mão apoia o braço esquerdo que está levantado com a mão esquerda apoiando levemente seu queixo.

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